Este fim-de-semana fui ao teatro.
Sinceramente, posso-vos dizer que desde o momento em que me vi à porta de um prédio no chiado (junto ao São Luiz) à meia-noite de um sábado já sabia que ia dar um post. Só podia e eu não me enganei.
Então foi assim:
Quando lá cheguei fiquei surpreendido pois não estava à espera de ver tanta gente à porta de um prédio comum, numa rua pouco iluminada e com uns caixotes do lixo à porta. E pensei: o que é que leva este pessoal a vir pr'aqui em vez de irem ali pó Bedroom ter com o groo? Nisto ouve-se alguém lá dentro gritar: Podem entrar! e entramos todos por um corredor escuro que nos leva até às escadas do prédio, onde está sentada uma miuda com uma caixa de moedas à frente.
Pouco a pouco, todos vão dando o nome e pagando a entrada; não muito caro, digamos, um euro e meio.. e todos se vão sentando nas escadas do prédio até que seja hora de subir, pensando no que vai acontecer no 3º andar daquele prédio.
Através das conversas e dando uma vista de olhos às pessoas que ali estão, percebe-se que estas não são propriamente normais. Sobressai um clima de boa disposição e dá para entender que estão ali pessoas de mente aberta, de espírito livre e pensamento criativo. Fico na expectativa; não faço a mínima ideia do que poderá vir a acontecer, mas o sentimento do desconhecido leva-me a ter um nervoso miudinho que apenas a presença da Sílvia e das nossas amigas ajuda a atenuar.. (desculpa lá seco, prá proxima não me esqueço de ti)
Finalmente dão ordem pra subir; está tudo pronto e cada passo dado faz-me sentir que a possibilidade de voltar para trás (baixo) e desistir é quase nula.
Entro na porta do último andar do prédio, um grupo sobe o último lance de escadas à minha frente e apanho um enorme susto! No cimo das escadas está uma rapariga deitada no chão, de barriga para cima, de braços abertos e voltada com a cara para nós, de maneira que quando as pessoas à minha frente se desviaram para passar, os seus olhos sem expressão fixaram os meus e fiquei com a sensação de que aquela rapariga estava sem vida. Foi então que pensei que se calhar estava no sítio errado, que tinha vindo parar a algum ritual ou a alguma experiência sobrenatural; mas as pessoas à minha volta pareciam descontraídas e nada levava a crer que tal pudesse acontecer. Então passei ao lado da rapariga e procurei avaliar o espaço em meu redor, procurando extrair o significado de cada objecto e de cada um dos restantes 4 actores.
Então todos se começaram a sentar no chão daquele hall de entrada.
O espectáculo começou.
Á minha esquerda estava um rapaz deitado sobre uma enorme folha repleta de equações e integrais misturados com frases de amor que se estendia do chão e se propagava pela parede.
A sua primeira frase foi: Será que espetar um garfo num olho não se pode considerar um gesto de amor? como dar uma flor ou escrever um poema?
Ele representava um rapaz que por amor fazia tudo, até que num momento de ódio misturado com ciúme e desespero matou a própria namorada.
Á minha direita estava uma rapariga, sonhadora, que passava os dias a olhar pela janela e recordava os tempos e os costumes da mãe, os seus vícios e as suas ordens, e vivia presa a esses hábitos impostos outrora.
À minha frente estava um rapaz de tronco nu, embrulhado com o que parecia ser um lençol. De todos era o mais expressivo, o seu olhar e o tom de voz deixavam toda a gente suspensa e atenta. Representava um rapaz que não conseguia viver com todas as definições que definem o mundo em que vivemos, e que à partida, o próprio termo definição teve de ser definido por alguém, e por isso tentar fugir de todas as regras da sociedade é um ciclo vicioso que não tem saída. Tudo porque teve uma infância rígida, em que foi obrigado pelo pai a fazer tudo o que este sempre quis que ele fizesse, até ao dia em que se libertou dessa corrente e afogou a sua mente num mar de dúvidas e questões que não tem fim.
A rapariga que estava deitada à entrada vivia em constante sofrimento pela perda de uma pessoa amada, e a sua vida não passava disso mesmo, um constante sofrimento.
Por fim, havia mais uma rapariga que estava na sala adjacente à minha, e que tinha constantes mudanças de humor e de vontades. Simbolizava alguém que sempre esteve habituada a ter tudo, e que ficou sem quem lhe fizesse os favores.
Ainda havia mais uma televisão ao pé de mim, que passava a imagem de uma rapariga numa casa-de-banho, com todo o corpo envolto num plastico transparente, daqueles que utilizamos para a comida. Ela passou todo o tempo a tentar livrar-se do plastico e, no fim, tomou um banho e vestiu-se, dando a ideia de estar cansada. Penso que simbolizava o esforço das pessoas em se libertarem desta prisão em que a teia da sociedade nos envolve, e a aproveitarem as sensações da vida.
Todos estes actores, todos estes cenários, interactuavam segundo uma certa cadência, e a montagem de todos estes planos opostos foi sensacional, levando cada pessoa a identificar-se com um bocado de cada personagem.
Esta foi a 1ª parte do espéctaculo. A 2ª já teve um ritmo diferente e foi mais uma apresentação do grupo, "Há-que-dizê-lo", e uma amostra de tudo o que têm feito desde há uns anos pra cá.
Começou-se por ouvir a música dos Jogos Sem Fronteira (lembram-se?), e cada um de nós foi sendo chamado para um grupo diferente. Eu pertencia à Baixa da Banheira, mas também havia por exemplo o grupo da Amadora. E o cómico que foi estar num 3º andar dum prédio do chiado, à 1h da manhã, a gritar a plenos pulmões: Baixa da Banheira! Baixa da Banheira!!
O objectivo foi tirar o pessoal do meio da sala, e todos ficámos á volta dela. Depois seguiu-se uma apresentação do grupo, super-hilariante, com peças fantásticas e com um sentido de humor fora do vulgar. Desde as ridículas séries deprimentes do Noddy, passando pela terrível visão do José Cid todo nu só com o cd de platina á frente, desde alusões a tempos antigos do esquadrão classe A, macgyver, etc.. Muito muito fixe.
Para terminar foi servido a todas as pessoas um lanche com sandes e sumos à mistura. Então foi montada uma tenda no meio da sala onde entraram todos os actores; nisto aparece um homem de outra parte da casa (era o pereira do sítio, encarregue de ter todo o material pronto) e diz:
Em nome dos actores, Boa noite e Obrigado pela vossa companhia. E saiu.
Gostei da experiência, nunca tinha ido a um teatro "alternativo" e espero repetir futuramente.
Abraços Riscados, Boa tarde e Obrigado pela vossa companhia. E acabei.
terça-feira, março 28, 2006
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3 comentários:
explica-me como eu tivesse 4 anos!
Se calhar a miúda á entrada olhou para ti a pensar "- O meu amor voltou". se calhar a gaja na casa de banho, embrulhada em plástico, representava uma pessoa que não queria ter nascido, e como a sua existência foi acidental envolveu-se num plástico para simular um preservativo, ou seja ela queria ter vivido e morrido como espermatezoide...
... Isto sim é open mind
vidros não te preocupes que eu sei que és um gajo aberto, ok?
muuuiiittoooo aberto..
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